domingo, 24 de março de 2013

Segurança: Sistema Penitenciário do Rio Grande do Norte em COLAPSO!



Fotos Ilustrativas
Um problema antigo, cíclico e sazonal que ocorre na segurança pública do Rio Grande do Norte é a questão da interdição judicial de penitenciárias e cadeias públicas e estabelecimentos congêneres. Isto ocorre em geral pela superlotação e por problemas estruturais. Os juízes das varas de execução penal das comarcas do Estado geralmente determinam em suas decisões que o estabelecimento prisional não receba mais nenhum preso, seja por mandado ou por prisão em flagrante. Então surge o problema: “de quem é a responsabilidade pela custodia do preso provisório?”. Atualmente por decisão judicial instituições prisionais estão interditadas em Natal, Mossoró Assu e Caicó. A mais recente decisão é do Juiz da Vara de Execuções Penais da Comarca de Mossoró que interditou todo o sistema penitenciário local, e não nos interessa questionar o ato do Poder Judiciário que geralmente é meramente técnico e legal.
A verdade é que o Governo do Estado é omisso e irresponsável com este problema e isto ocorre há muito tempo. Quem deve construir e aumentar o número de vagas de forma a comportar a demanda de presos ingressantes no sistema penitenciário é o gestor público do Estado. Para entedermos o caso, vejamos uma situação fictícia:

“Diante da situação atual de que o Juiz local interditou a Cadeia Pública, vamos supor que VIRGULINO (nome fictício) seja preso por tráfico de drogas pela polícia militar e apresentado na delegacia de plantão. O delegado plantonista lavrou o flagrante por tráfico de droga. Pela legislação vigente apresentado e recebido o preso pela polícia judiciária (polícia civil) a responsabilidade sob a custória do preso deixa de ser da PM e passa a ser da polícia civil. Responsabilidade de custódia esta, que segundo a legislação vigente perdura o tempo suficiente da lavratura do procedimento (o Auto de Prisão em Flagrante) e na medida em que este procedimento for concluído, e como o caso não comporta a liberdade provisória com fiança na esfera policial, o preso provisório deve ser imediatamente encaminhado à Cadeia Pública, passando a ser custodiado pelos agentes penitenciários estaduais. Vejamos que nesta ação participam agentes de duas Secretarias de Estado: Policiais militares e Policiais civis que integram a SESED e Agentes Penitenciários que integram a SEJUC (COAPE). No caso de estar a Cadeia Pública interditada os agentes penitenciários recebem ordem dos superiores de não receber o preso. E este é o problema?”.

Partindo do pressuposto que depois de autuado em flagrante o preso provisório deve ser entregue à COAPE/SEJUC por imposição legal, deixando de ser responsabilidade da SESED, e neste sentido a negativa dos agentes da COAPE-SEJUC em receber o preso é um engano jurídico praticado pelos administradores e coordenadores ligados à COAPE/SEJUC, na medida em que a “decisão judicial que vigora é de interdição do espaço físico ou geográfico da Cadeia Pública”, ou seja, para aquele local não é permitida o recebimento de nenhum preso a partir da decisão judicial. “Todavia a obrigação pelo dever funcional de receber o preso continua válido e esta obrigação não sofreu nenhuma interdição”, devendo os gestores e administradores da COAPE/SEJUC receberem o preso e definirem outro local para sua custódia, seja dentro dos seus diversos centros ou unidades prisionais, ou ainda estabelecer outros locais de forma provisória, lembrando que sempre sob a custódia e vigilância dos agentes penitenciários, cujo cargo foi criado por lei e a função específica é a vigilância e custódia de presos. O que não se tolera é que a polícia civil fique exercendo esta função, o que consideramos um desvio de função e uma ação tipicamente ilegal dentro do atual ordenamento jurídico. Esta corrente de custódia do preso tem três elos: 1º) inicia com a prisão; 2º) em seguida ocorre a lavratura do ato que legaliza sua prisão; e 3º) a entrega e definição de seu local de custódia provisória. Onde será comunicada ao Juiz e ele estará a disposição da justiça.     
Na verdade sempre que este problema acontece o Governo e Secretários da SEJUC e SESED demoram a se entender e definir as responsabilidades e locais onde os presos devem ser custodiados, enquanto isso, são os delegados do local onde o dilema ocorre que devem administrar o caos, e muitas vezes presos são acorrentados ou algemados a grades e amontoados em salas inadequadas, gerando diversos problemas, como o risco de fuga, motim, e desvio de função. Porque estes gestores do alto escalão do governo não sentam numa mesa e vaticinam de uma vez por todas esta polêmica fazendo valer a lei e a responsabilidade administrativa?   
Já existe inclusive uma sentença judicial, a partir de uma ação civil pública (001.06.026377-7), que transitou em julgado pelo Tribunal de Justiça (TJ), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF), na qual decidiu-se que  "policial civil do RN não deve mais custodiar presos de justiça". Não é da competência ou atribuição legal e nem administrativa da Polícia Civil custodiar presos. Todos sabem que nas delegacias não existem mais celas e que a nossa função é investigar crimes, sua autoria e prender os criminosos e entregar ao sistema prisional.
Nós conhecemos a realidade dos problemas inerentes às deficiências orçamentárias, estruturais e humanas da SESED e SEJUC, no entanto cada uma destas secretarias tem seus problemas, conforme atribuições e finalidades determinadas por lei, e cada gestor deve gerenciar seus conflitos e problemas evitando omisões de cunho legal e funcional. A Lei n° 7.210/1984, determina que o preso provisório deve obrigatoriamente ser custodiado em estabelecimento penal na modalidade cadeia pública (categoria que não se confunde com delegacia de polícia ou unidade militar); o preso condenado deve ser custodiado em penitenciárias ou colônias agrícolas, industriais ou similares ou em casa de albergado. È fato público e notório que o Estado por anos aceitou custodiar diversos presos em celas de Delegacias de Polícia Civil em todas as cidades que compõem as diversas Comarcas do Rio Grande do Norte, não havendo agentes penitenciários suficientes para custódia dos mesmos, de modo que informalmente esta função coube à Polícia Militar ou polícia civil, tanto a guarda quanto o transporte de tais custodiados, com evidente prejuízo para a atividade-fim destas polícias.
E considerando que a Lei Estadual nº 7.131/1998, que dispõe sobre o Estatuto Penitenciário do Estado determina que os presos provisórios sejam recolhidos em estabelecimentos de segregação provisória, administrados pela Secretaria de Estado da Justiça e da Cidadania, nada mais justo e legal que o Governo do Estado através da SEJUC realize estudo e construa novas cadeias e penitenciárias no âmbito do Sistema Penitenciário Estadual do RN a fim de atender a demanda de presos, cumprindo assim sua obrigação. A manutenção de presos provisórios ou condenados, nas Delegacias de Polícia Civil, ou nas unidades da Polícia Militar viola dispositivos legais constitucionais e infraconstitucionais, gerando para o estado uma ação ilícita e causando ao servidor policial civil ou militar um inquestionável desvio de função, o que não aceitamos e repudiamos veemente.  
O Juiz que assinou a decisão de interdição local quando incitado sobre onde seria o local de custódia dos presos provisórios alegou que não lhe cabia definir onde os presos deveriam ser recolhidos, e neste ponto concordo com o magistrado, no entanto, embora não tenha lido a decisão, entendo que a ordem judicial foi omissa em um ponto, considerando a competência de Juiz da Vara de Execuções Penais e observando ainda toda a legislação que delimita a competência administrativa da SEJUC, defendemos que o ilustre magistrado poderia ter em sua decisão acertada e dentro dos parâmetros legais de interdição, inserido uma determinação para que o Secretário da SEJUC cumprisse sua obrigação legal e administrativa de receber o preso e a responsabilidade de definir o local de sua custódia provisória o que era mais justo e coerente, esperamos que os Juízes quando interditarem locais de recebimento de presos, cuja administração é da SEJUC, determinando que naquele espaço geográfico carcerário não mais se receba preso que na mesma decisão determine à SEJUC que receba os novos presos e resolva o problema de onde eles devem ser custodiados porque este problema pertence à sua finalidade organizacional, ou seja, está dentro de suas prerrogativas e deveres funcionais.
Enquanto o Governo e Secretários dizem que estão tentando resolver o problema desde o dia 19/03/2013, hoje já é dia 23/03/2013 e nada de concreto ficou resolvido, não existe local definido e indicado pela COAPE/SEJUC para receber as presos e estes ficam pelos corredores e algemados em grades, em instalações e condições desumanas, sem alimentação, sem cuidados médicos, sem segurança. E medidas paliativas foram definidas pelo Ministério Público local que sensibilizado com o problema da polícia civil relativo aos presos provisórios, problema que na verdade não nos pertence, emitiu a Recomendação 01/2013 onde recomenda que as autoridades policiais liberem autuados sem pagamento de fiança, nos crimes em que a fiança possa ser arbitrada pelo delegado e quando os presos não tiverem condições de pagar o valor mínimo, bem como, nos casos em que não seja permitida a fiança na esfera policial que se represente ao Juiz pela liberdade provisória e expedição de alvará ou que o Juiz plantonista indique o local de custódia da pessoa presa.
Concluo nosso raciocínio no sentido de que após a lavratura da prisão em flagrante que não comporte liberdade provisória na esfera policial, bem como, na prisão por cumprimento de mandado de prisão, entendemos que o preso deve ser apresentado e recebido pela COAPE/SEJUC mesmo havendo interdição judicial de estabelecimento prisional, porque esta interdição é daquele espaço prisional, havendo em todo o Estado outros espaços prisionais que podem receber o preso, bem como, é sua responsabilidade legal e funcional receber o preso provisório e encontrar uma alternativa viável de custódia para o mesmo e podemos citar para embasar estes argumentos, diversos dispositivos legais: Art. 2º da Lei Federal Nº 10.693/2003 e Art. 28, Inc. III, do Decreto Federal Nº 6.061/2007 (por analogia ou equivalência de função do agente penitenciário federal com o agente penitenciário estadual); Art. 102 da Lei Federal Nº 7210/1984 (que indica a cadeia pública como local de recolhimento de presos provisórios); Art. 1º da Lei Estadual 7131/1998 (que atribui à SEJUC a responsabilidade do sistema penitenciário do RN); Art. 2º da Lei Estadual Nº 270/2004 (Estatuto da Polícia Civil – onde o texto define a função da policia civil no âmbito da SESED); e por fim a Lei Estadual Nº 7.097/1997 que criou o cargo (ou cargos) de agente penitenciário estadual e definiu sua atribuição funcional.   

Edvan Queiroz – Delegado de Polícia Civil

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